Se existe um personagem no cinema que conseguiu transformar automóveis em co-protagonistas de suas histórias, esse personagem é James Bond. Ao longo de seis décadas, o agente secreto mais famoso do mundo não apenas salvou o planeta inúmeras vezes — ele também definiu tendências de estilo, luxo e performance atrás do volante.
por Murillo Cerchiari
Fundador The Garage
Aston Martin DB5
Estreando em Goldfinger (1964), o DB5 não foi apenas um carro de cena, junto ao James Bond, tornou-se o arquétipo do “carro de espião”. Seu design elegante, motor de 282 cv e velocidade máxima de 233 km/h já impressionavam, mas foi o arsenal da Q Branch que o eternizou — metralhadoras, cortina de fumaça, placas giratórias e o lendário assento ejetor.
Mais do que um carro, o DB5 virou um mito. Retornou em várias eras da franquia, de Sean Connery a Daniel Craig, sempre como um lembrete do estilo atemporal de Bond. Até hoje é considerado o automóvel definitivo do agente secreto.


Lotus Esprit S1 – O Submarino de Giugiaro
Quando Roger Moore assumiu o volante em O Espião que Me Amava (1977), o público imediatamente conheceu um carro que parecia ter saído de um futuro distante: o Lotus Esprit S1. Suas linhas geométricas em estilo “papel dobrado”, criadas por Giorgetto Giugiaro, já transmitiam ousadia em terra firme. No entanto, foi na tela que o Esprit conquistou status de lenda, pois se transformava em submarino equipado com mísseis, torpedos e até uma cortina de fumaça subaquática.
Além de impressionar visualmente, essa cena consolidou o Esprit como um verdadeiro ícone pop. A reação do público foi tão intensa que a Lotus viu sua lista de espera disparar, mostrando como o cinema podia transformar um modelo em objeto de desejo imediato. Hoje, o carro permanece na memória coletiva não apenas pelo design futurista, mas também por ser um dos gadgets automotivos mais criativos de toda a franquia 007.


Ford Mustang Mach 1
Em Os Diamantes São Eternos (1971), James Bond trocou os GTs britânicos pela força bruta de um Ford Mustang Mach 1 vermelho. Com motores V8 poderosos de até 7.0 litros, o muscle car foi a escolha perfeita para as ruas luminosas de Las Vegas.
A cena mais famosa é a manobra em duas rodas para atravessar um beco estreito. Curiosamente, ela ficou marcada por um erro de continuidade: o carro entra inclinado sobre as rodas do lado direito e sai sobre as do lado esquerdo. Em vez de atrapalhar, o erro transformou-se em folclore, tornando essa perseguição uma das mais discutidas da saga. O Mustang Mach 1 trouxe à franquia o DNA americano de excesso, potência e espetáculo.


Toyota 2000GT
Em Só Se Vive Duas Vezes (1967), o cinema apresentou ao mundo o primeiro supercarro japonês: o Toyota 2000GT. Equipado com um motor 2.0 de seis cilindros em linha e um design claramente inspirado no Jaguar E-Type, o modelo representava uma declaração ousada da indústria nipônica: o Japão podia, sim, competir de igual para igual com a elite automotiva europeia.
No entanto, um detalhe curioso marcou sua história. Sean Connery, intérprete de Bond, era alto demais para caber no coupé original. Para resolver o problema, a Toyota decidiu criar duas versões roadster especialmente para o filme. Como nunca foram colocadas à venda, esses exemplares exclusivos se transformaram em peças raríssimas da história automotiva.
Mesmo sem Bond ao volante — já que quem conduzia o 2000GT era a aliada Aki — o carro roubou a cena. Com isso, mostrou que estilo e exclusividade também fazem parte do lifestyle 007, provando que um automóvel pode brilhar tanto quanto o próprio agente secreto.

BMW Z3 – Marketing de Sucesso
O BMW Z3 foi o primeiro carro alemão a aparecer em 007, estreando em GoldenEye (1995). Apesar do tempo mínimo em tela e de seus gadgets (como mísseis escondidos) nunca terem sido usados, o impacto foi gigantesco. O roadster foi lançado oficialmente poucos meses depois e registrou uma explosão de vendas.
Mais do que um carro, o Z3 foi um case de marketing global: a simples associação com Bond bastou para transformá-lo em objeto de desejo, mostrando o poder da franquia na cultura automotiva.

BMW 750iL
Dois anos depois, em O Amanhã Nunca Morre (1997), Bond guiou um BMW 750iL, um sedan executivo que parecia improvável para perseguições. Mas a mágica da Q Branch o transformou no carro mais tecnológico da saga: pneus auto-reparáveis, foguetes no teto solar, sistema de defesa elétrica e, o mais visionário, a possibilidade de ser dirigido remotamente via celular Ericsson.
A cena de Bond controlando o carro de dentro de um estacionamento tornou-se icônica e antecipou tecnologias que hoje parecem normais, como estacionamento automático e direção remota. O 750iL provou que luxo e inovação podem andar de mãos dadas na vida de um espião.

BMW Z8
O auge da parceria entre 007 e a BMW chegou com o Z8, em O Mundo Não é o Bastante (1999). Esse roadster de design retro-futurista, assinado por Henrik Fisker, escondia sob o capô o mesmo motor V8 de 400 cv do lendário M5. Assim, unia desempenho brutal a linhas elegantes, criando um carro simplesmente perfeito para Bond.
Além do estilo, o Z8 também trazia o tempero da Q Branch: blindagem de titânio e mísseis escondidos nas laterais. Tudo indicava que ele teria um papel marcante na trama. No entanto, o inesperado aconteceu. Em uma cena chocante, um helicóptero equipado com serras circulares literalmente partiu o carro ao meio.
Mesmo com uma participação curta, o Z8 deixou sua marca. O modelo virou cult entre colecionadores e simbolizou, de forma dramática, o encerramento da era alemã na franquia James Bond.

Aston Martin DBS V12
Com Daniel Craig em Casino Royale (2006), o tom da franquia mudou de forma decisiva: ficou mais realista, sombrio e visceral. Nesse contexto, o Aston Martin DBS V12 surgiu como o reflexo perfeito dessa nova fase. Afinal, tratava-se de um supercarro de 510 cv, capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em apenas 4,3 segundos e alcançar a impressionante velocidade máxima de 307 km/h.
Em vez de depender de gadgets extravagantes, o carro apostava em soluções práticas e funcionais. Por exemplo, o desfibrilador escondido no porta-luvas teve papel fundamental em uma cena crucial, quando Bond precisou salvar a própria vida após ser envenenado. Dessa forma, o veículo deixou de ser apenas um arsenal de truques para se tornar um verdadeiro instrumento de sobrevivência.
Por fim, sua destruição espetacular — em um acidente que entrou para o Guinness Book pelo maior número de capotagens em cena — representou muito mais do que um feito técnico. Ela simbolizou a vulnerabilidade do novo 007 e reforçou a transformação do personagem, que agora se mostrava mais humano, falível e intenso.

Estilo, Cultura e Performance
Mais do que coadjuvantes, os carros de James Bond são símbolos de estilo e lifestyle. Cada modelo reflete o espírito de sua época: o glamour britânico dos anos 60, a ousadia futurista dos 70, o poder americano dos 70, o high-tech corporativo dos 90 e a brutalidade realista dos anos 2000.
Eles não são apenas máquinas de metal, couro e borracha. São narradores silenciosos, moldando a lenda do espião britânico e inspirando gerações de entusiastas.
No universo de 007, a licença para matar sempre vem acompanhada de uma licença para dirigir — e com estilo.
